Desenvolvimento de novos medicamentos: uma jornada fascinante
- siteconscienciaufr
- 19 de mai.
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Dipirona, paracetamol, ibuprofeno, fármacos tão utilizados hoje em dia, porém você já se perguntou como eles foram desenvolvidos?
Todo medicamento, antes de chegar ao mercado, precisa passar por diversas etapas de pesquisa para garantir sua segurança e eficácia, sendo um processo que pode demorar anos, custando milhões e pode não haver êxito. Estas etapas são divididas, em geral, em 6: descoberta, pré-clínico, fases clínicas 1, 2, 3 e farmacovigilância (também chamada de fase clínica IV).
Antes disso
Antes de começar esta jornada pela descoberta de fármacos precisamos entender como funcionam os fármacos. Eles são moléculas microscópicas, que podem ser de origem natural (obtido a partir da natureza), semi-sintética ou sintética, que provocam seu efeito devido a sua ligação específica com receptores presentes em nosso organismo. Podemos imaginar essa cena através do modelo chave-fechadura, na qual a ‘chave’ seria o fármaco e a ‘fechadura’ o receptor, e àquela pode abrir somente esta fechadura.
Os fármacos, em geral, se ligam a estes receptores, que são alvos específicos em nosso corpo.
Chamamos de “alvo terapêutico”, que ao ser ativado pela ligação do fármaco, desencadeará uma gama de efeitos celulares que irá resultar em um efeito benéfico, por exemplo, a redução da inflamação ou a redução da pressão arterial.
No entanto, em alguns casos, efeitos adversos podem ser desencadeados devido à ligação do fármaco com outros receptores inespecíficos ou em receptores presentes em outras partes do corpo.
Fase de pré-descoberta
Antigamente, a descoberta de fármacos era feita por acaso ou através da observação da natureza, não somente como um remédio físico, mas também espiritual. Como por exemplo, o curare, que é uma mistura de ervas feitas pelos indígenas, usada para paralisar a caça, que futuramente daria origem à tubocurarina, um relaxante muscular, utilizado para anestesia geral.
Com o avanço da ciência, o cenário mudou, sendo, primeiramente, necessário descobrir o alvo terapêutico da doença através de estudos celulares, proteicos, genômicos etc... Porem, é extremamente desafiador, por que muitas doenças ainda não tem causas e alvos moleculares definidos e o custo para esta descoberta é muito alto.
Fase de descoberta (5 a 6 anos)
Depois de encontrar o alvo terapêutico, é preciso encontrar a molécula, que se encaixa neste alvo.
Para isso, são analisados milhões ou bilhões de moléculas, através de um computador, podendo realizar modificações em suas estruturas, e uma série de testes são feitos, sendo um dos objetos de estudo da Química medicinal farmacêutica. No final desta fase, centenas de moléculas são selecionadas para a fase pré-clínica.
Fase pré-clinica (2 a 3 anos)
Nesta fase, são realizados testes in vitro, realizados em tubos de ensaio, estes testes são chamados de “alto rendimento”, pois são testes rápidos e feitos em larga escala a fim de reduzir o número de candidatos a fármacos de algumas centenas para apenas 10 a 20 candidatos.
Em seguida, testes in vivo, com pelo menos 2 modelos animais são realizados. Nestes testes, diferentes doses, vias de administração e efeitos tóxicos dos candidatos a fármaco são avaliados. Atualmente, por questões bioéticas, alguns modelos alternativos sem o uso de animais estão sendo utilizados, demonstrando um grande avanço na sociedade científica.
Após esses testes, o candidato promissor, para passar para a fase clínica envolvendo humanos, precisa ser registrado como Investigational New Drug (IND) ou no caso do Brasil, o Desenvolvimento Clínico de Medicamento (DDCM), seguindo RDC Nº 945, DE 29 DE NOVEMBRO DE 2024, através de relatório que é submetido às agências reguladoras, no caso do Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Para este registro, é necessário apresentar uma série de documentos contendo resultados de toxicologia, posologias, eficácia e também o protocolo clínico a ser realizado. Caso o IND seja aprovado, o candidato à fármaco pode seguir para fase clínica.
· Ensaios clínicos (4-7 anos)
O ensaio clínico em indivíduos saudáveis ou com a doença pesquisada deverá seguir as Boas Práticas Clínicas (BPC) e o medicamento, as Boas Práticas de Fabricação de medicamento experimental (BPF). Os testes clínicos, consistem em 3 a 4 fases, dependendo do candidato à fármaco.
Fase 0
Esta etapa consiste em testar pequenas doses, em um número pequeno de indivíduos, de 10 a 12 participantes, em geral, voluntários saudáveis a fim de saber sobre a segurança do medicamento em estudo. Geralmente, feito em farmacos quimioterapicos
Fase 1 (1 a 6 meses)
Consiste em um estudo que avalia um número pequeno de indivíduos, geralmente de 20 a 100 indivíduos, saudáveis ou com a enfermidade, afim de testar a segurança e também outros parâmetros, como dose, absorção, distribuição, metabolismo e excreção pelo corpo.
Geralmente, levam meses de testes, e aproximadamente 70% dos candidatos a fármacos passam para fase seguinte.
Fase 2 (3 meses a 2 anos)
Consiste em um estudo com um número maior de pacientes (50 a 200 indivíduos) com a enfermidade estudada a fim de observar a eficácia e a segurança do medicamento.
Demorando até 2 anos, essa fase consiste em acrescentar dados clínicos, para desenvolver protocolos para fase 3. Geralmente, 33% dos candidatos a fármacos passam para fase seguinte.
Fase 3 (1 a 4 anos)
Esta fase avalia um grande número de pacientes (300 a 3000 indivíduos) com a enfermidade, sendo realizado em vários hospitais em diferentes regiões do país e do mundo.
Consiste em um estudo randomizado duplo cego, ou seja, há a administração do candidato em alguns e placebo em outros, sem a pessoa responsável pela administração saber, a fim de evitar viés no estudo. Este estudo irá avaliar a eficácia e os efeitos adversos do candidato à fármaco.
Após essa fase, é submetido uma nova solicitação à agência regulatória, com um relatório descrevendo os testes clínicos, pré-clinicos, a segurança, a eficácia do candidato à fármaco e também a bula.
Geralmente, esta autorização leva entre 1 a 2 anos, podendo ainda ser solicitado estudos adicionais pela agência regulatória
Farmacovigilância (ou Fase 4)
Após a aprovação pela agência regulatória, a indústria ganha permissão para a fabricação e comercialização do medicamento, que é patenteado, impedindo a produção do mesmo por outras empresas, por um tempo determinado.
O medicamento, agora no comercio, ficará em observação para avaliar a segurança em um período mais prolongado e em um número maior de pacientes. Esta fase envolve a notificação de efeitos adversos, reações adversas e outros problemas.
Referencias:
SINGH, N. et al. Drug discovery and development: introduction to the general public and patient groups. Frontiers in drug discovery, v. 3, 24 maio 2023
Zurdo, Jesus. (2013). Developability assessment as an early de-risking tool for biopharmaceutical development. Pharmaceutical Bioprocessing. 1. 29-50. 10.4155/pbp.13.3.
FDA. Step 2: Preclinical Research. Disponível em: <https://www.fda.gov/patients/drug-development-process/step-2-preclinical-research>.
RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA ANVISA Nº 945, DE 29 DE NOVEMBRO DE 2024. Disponível em: <https://anvisalegis.datalegis.net/action/ActionDatalegis.php?acao=abrirTextoAto&tipo=RDC&numeroAto=00000945&seqAto=000&valorAno=2024&orgao=RDC/DC/ANVISA/MS&codTipo=&desItem=&desItemFim=&cod_menu=1696&cod_modulo=134&pesquisa=true>.
Manual para Submissão de Dossiê de Desenvolvimento Clínico de Medicamento (DDCM) e Dossiê Específico de Ensaio Clínico - 3a edição.pdf — Agência Nacional de Vigilância Sanitária - Anvisa. Disponível em: <https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/medicamentos/pesquisa-clinica/manuais-e-guias/manual-para-submissao-de-dossie-de-desenvolvimento-clinico-de-medicamento-ddcm-e-dossie-especifico-de-ensaio-clinico-3a-edicao.pdf/view>. Acesso em: 2 maio. 2025.
FOOD AND DRUG ADMINISTRATION. New Drug Application (NDA). Disponível em: <https://www.fda.gov/drugs/types-applications/new-drug-application-nda>.
FOOD AND DRUG ADMINISTRATION. The Drug Development Process. Disponível em: <https://www.fda.gov/patients/learn-about-drug-and-device-approvals/drug-development-process>.
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