É verdade que alguns antidiabéticos realmente causam perda de peso, mas essa não é uma finalidade aplicada na bula na maioria das vezes. Entretanto, estão sendo utilizados atualmente para o emagrecimento de pessoas não portadoras de Diabetes. A automedicação tem sido cada vez mais comum no Brasil, mas dificilmente os usuários sabem dos possíveis riscos que podem estar sujeitos.
Mas, o que é o Diabetes?
É uma doença do metabolismo relacionada com a hiperglicemia persistente devido à redução na produção do hormônio insulina ou até é produzido em quantidades normais, mas a ação dele não é efetiva. Na diabetes tipo 1, o organismo produz muito pouca ou nenhuma insulina, ou seja, é um paciente insulinodependente, exigindo a aplicação diária do hormônio (exemplo na imagem abaixo).
No caso do diabetes tipo 2, que ocorre predominantemente em adultos obesos ou com sobrepeso, há produção de insulina, mas o hormônio não funciona muito bem, as células desses pacientes são resistentes à insulina.
Isso ocorre porque há uma relação entre obesidade e insulina: o hormônio também é responsável pelo metabolismo das gorduras; o acúmulo de gordura atua aumentando a demanda por insulina em pacientes obesos, em um ponto que as células perdem a sensibilidade à insulina. Com isso, ocasiona aumento da glicemia e consequente hiperinsulinemia. Desse modo, obesos desenvolvem diabetes, com aumento de glicose no sangue e necessitam de medicamentos antidiabéticos, melhorando a resistência à insulina.
Há variados tipos de antidiabéticos e vários possíveis mecanismos de ação para efetuar esse controle metabólico. Como estes medicamentos também causam perda de peso, vem sendo utilizados para o emagrecimento em diversos casos.
Vamos procurar entender sobre os tipos e como funcionam alguns desses antidiabéticos:
Inibidores de SGLT-2
Também chamados de Transportadores de Sódio-Glicose-2, os SGLT-2 estão localizados nos rins. São os responsáveis por reabsorver cerca de 90% da glicose para que possa ser reaproveitada. Portanto, seus inibidores fazem com que tudo isso seja eliminado na urina, induzindo a chamada glicosúria.
Realmente já foi observada redução de peso em usuários desse tipo de medicamento, como empagliflozina e dapagliflozina, mas é moderada considerando que há mecanismos de contra-regulação (como aumento no apetite e ingestão calórica) para manter o peso. Esses antidiabéticos são eficientes no controle da glicose, no impacto de riscos de eventos renais graves e cardiovasculares e na pressão arterial.
Análogos de GLP-1
O Peptídeo 1 do tipo Glucagon é um hormônio liberado em resposta à ingestão de alimentos como glicose, gorduras e aminoácidos. É responsável por reduzir a glicemia. Além disso, alguns estudos demonstraram aumento da saciedade desencadeando redução da ingestão de alimentos e, como consequência, perda de peso.
Mas, como atuam?
Como os análogos de GLP1-1 imitam uma substância produzida no organismo que dá a sensação de saciedade, fazem com que os pacientes comam menos e se sintam satisfeitos mais rapidamente. Além disso, também diminuem o movimento da comida em direção ao intestino delgado, fazendo com que ela permaneça mais tempo no estômago, o que ajuda na sinalização da saciedade.
Um exemplo de medicamentos que atuam dessa maneira é a Liraglutida. Começou-se a perceber perda de peso não só em pacientes com diabetes, mas naqueles que não apresentavam a doença também. Entretanto, em 2011, a ANVISA era reticente e aprovava o uso apenas como antidiabético.
Quais os efeitos adversos e perigos dessa substância?
Hipoglicemia;
dor de cabeça;
náusea;
diarreia;
risco de pancreatite;
alterações da função renal;
alterações da tireoide; e
desidratação.
Mas ao longo dos anos com estudos mostrando resultados mais conclusivos positivos para o fármaco, o FDA (Food and Drug Administration – agência reguladora relacionada ao departamento de saúde dos Estados Unidos), em 2014, aprovou e reconheceu o uso de Liraglutida também para obesidade e sobrepeso, apresentando-se uma terapia segura. E, mais tarde, a ANVISA, em 2016, também aprovou o registro do medicamento para o controle crônico de peso em associação a uma dieta hipocalórica e aumento do exercício físico.
Ao contrário da Liraglutida, outro medicamento análogo ao GLP-1, a Semaglutida ainda não é indicada para obesidade pela ANVISA, mas alguns médicos já a consideram no regime off label, ou seja, uso diferente do aprovado em bula (antidiabético) ou termo usado para produto não registrado no órgão regulatório de vigilância sanitária (ANVISA) para finalidade diferente da descrita em bula.
Quais os efeitos adversos e perigos dessa substância?
Hipoglicemia;
tontura;
náusea;
diarreia;
vômito;
dor abdominal;
constipação;
gastrite;
flatulência;
fadiga; e
entre outros.
Biguaninas
Considerada da classe sensibilizadoras de insulina, um dos exemplos clássicos de biguaninas é a Metformina. Na medicina tradicional, é utilizada como antidiabético em pacientes com diabetes tipo 2 ou com resistênia à insulina. Esse fármaco age, basicamente, através de três mecanismos:
reduzindo formação de glicose no fígado por inibição/diminuição da gliconeogênese e glicogenólise;
aumentado a sensibilidade à insulina através da captação e utilização da glicose periférica; e
retardando a absorção no intestino (de glicose).
Basicamente, esse medicamento causa efeitos sobre o gasto de glicose e de lipídeos em diversos órgãos, o que reduz a produção de ácidos graxos livres e aumenta a perda de peso.
Assim como a Semaglutida, a Metformina também não é indicada para somente obesidade; mas sim é utilizada como agente antidiabético, recomendando seu uso com regime alimentar. Como fator de curiosidade, também pode ser indicada para Síndrome dos Ovários Policísticos.
Restrições de Uso
Os medicamentos são restritos para gestantes, lactantes, pessoas com problemas no fígado ou pâncreas ou histórico de carcinoma medular de tireoide na família. Por isso é tão importante buscar um acompanhamento médico. A introdução do medicamento deve ser feita aos poucos, os efeitos são observados e cuidados para que o paciente o utilize de maneira segura.
Em geral, medicamentos para emagrecer não são a primeira opção para tratar o sobrepeso, são indicados para casos bem específicos e sob orientação de um profissional, o que evita efeitos adversos sérios, já que o tempo de tratamento e as doses administradas são acompanhadas pelo profissional.
Os Riscos da Automedicação
O uso inadequado, como o intervalo incorreto das injeções ou a má regulação das doses, pode aumentar o risco de reações adversas e, ainda, prejudicar o resultado do tratamento.
A semaglutida, em especial, tem chamado a atenção porque, além de poder ser comprada sem receita, é aplicada apenas uma vez por semana – diferentemente da liraglutida, cuja injeção é diária.
Importante lembrar que, sem a orientação de um profissional, é provável que aconteça um novo ganho de peso ao parar de usar o medicamento. Por isso, é preciso associar o tratamento a mudanças no estilo de vida.
Conclusão
Medicamentos destinados para o tratamento do diabetes ajudam no emagrecimento, mas podem ser seguros com acompanhamento médico, com posologia e doses adequadas, pois os efeitos colaterais são frequentes e muitas vezes perigosos, trazendo prejuízos para a saúde.
Referências:
BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Como a Anvisa vê o uso off label de medicamentos.
SOUZA, Ana Karine de Andrade. Interferência dos antidiabéticos no sobrepeso: uma revisão de literatura. 2017. 53 fl. (Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia), Curso de Bacharelado em Farmácia, Centro de Educação e Saúde, Universidade Federal de Campina Grande, Cuité – Paraíba – Brasil, 2017.
TOFETI, Gabriela do Amaral Louzada. Uso off label de medicamentos antidiabéticos. 2020. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo.
SCHORK, Anja et al. Effect of SGLT2 inhibitors on body composition, fluid status and renin–angiotensin–aldosterone system in type 2 diabetes: a prospective study using bioimpedance spectroscopy. Cardiovascular diabetology, v. 18, n. 1, p. 1-12, 2019.
DOURADO, Caio Tanajura Cazuza; NUNES, Carlos Pereira. A Influência da Metformina na Perda de Peso. Revista de Medicina de Família e Saúde Mental, v. 1, n. 2, 2019.
ESCRITO POR: Carolina Rodrigues Monteiro Barros (aluna de graduação em Farmácia - UFRJ)
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